Desde sempre somos confrontados com binómios antagónicos: O Bem e o Mal, o peso e a leveza do nosso amigo Kundera, o quente e o frio, o ser e o não ser... Mas toda a minha vida o binómio que se apresentou mais complicado de resolver foi o que opõe as diversas perspectivas de a encarar: o copo meio cheio ou meio vazio. Mas será que a escolha resolverá alguma coisa? É que, no fundo e apesar do livre arbítrio, a vida será sempre o meio copo que, incansavelmente, tentamos encher...
sexta-feira, 31 de julho de 2009
segunda-feira, 27 de julho de 2009
O meu estado de alma por Bernardo Soares
"non sto seduto tutto il giorno... mi muovo"
Caos Calmo é o melhor binómio antagónico que já encontrei para descrever a minha vida e é o nome do filme acabado de entrar para a minha lista de preferidos.
Nani Moretti, esse grande senhor do cinema italiano, entrou definitivamente para a lista dos poucos homens que me percebem. Já tinha tido essa impressão aquando do visionamento de Caro Diario, outro grande filme, realizado por Nani (para os amigos). Mas com Caos Calmo o homem deu conta de mim.
"i topi non avenano nipoti": palíndromo, frase que se pode ler nos dois sentidos, reversibilidade das coisas e sobre as coisas irreversíveis;
No meio do caos, quando a tristeza é tão profunda que não se sabe o que sentir, é indispensável uma ordem externa das coisas, uma rotina diária que permita que nos encontremos. Este senhor pára, senta-se num banco de jardim, lê o jornal, faz listas, espera pela filha, dá conselhos aos que passam.
Normalmente, não posso abandonar o trabalho para o fazer mas também eu tenho o meu jardim, Nani. Jardim ao pé do qual estaciono o carro, fumo cigarros, canto músicas, leio livros e faço listas. As listas são uma ajuda essencial em tempos de caos.
Aparentemente, somos apenas pessoas sentadas calmamente no banco de jardim... O caos nunca se revela. Não sei se isso é bom, se é mau... Mas é assim. E tu compreendes-me. Obrigada.
Lista dos homens que me compreendem:
Nani Moretti
Vinicius de Moraes
Pedro Paixão
Woody Allen
Cole Porter
Milan Kundera
Bernardo Soares
...
sexta-feira, 17 de julho de 2009
Fiona Apple - After You've Gone (Jazz Classic Cover)
Ela é simplesmente fabulosa.. e a música diz tudo. Enjoy! Now won't you listen to me honey while i say, How could you tell me that you're goin' away? Don't say that we must part, don't break my aching heart You know i've loved you truly many years, loved you night and day How could you tell it to me? can't you see my tears? Now listen while i say After you've gone, and left me crying After you've gone, there's no denying You'll feel blue, you'll feel sad You'll miss the dearest pal you've ever had There'll come a time, now don't forget it There'll come a time, when you'll regret it Some day, when you grow lonely You heart will break like mine and you'll want me only After you've gone, after you've gone away After you've gone, after the break up After you've gone, you're gonna wake up You will find that you were blind To let somebody come and change your mind After the years, we've been together Their joy and all tears, a-all kinds of weather Someday, when you're downhearted You'll long to be with me right back where you started After you've gone, after you've gone away!
quinta-feira, 16 de julho de 2009
The Proposal...
Não... Não vos venho aqui falar do novo filme da Sandra Bullock, estejam descansados... O que se passa é que comecei a ler o novo livro de Chico Buarque chamado "Leite Derramado". O texto que se segue é o primeiro capítulo dessa história sobre um homem doente com Alzeimer que conta estórias na sua cama de hospital. Esta é a declaração de amor em forma de pedido que aquele faz à sua enfermeira preferida. A sinceridade utópica desta personagem fez-me sorrir... Talvez todas as declarações de amor sejam utópicas, à sua maneira... Transcrevi este capítulo para partilhar convosco este pedacinho de alegria que tive e também para, ao estilo de "finding Forrest", habituar os meus dedos a escrever bem, na esperança que um dia eles o façam sozinhos. Por agora, deixo-vos com a genialidade de Chico Buarque de Holanda. Amen!
"Quando eu sair daqui, vamos nos casar na fazenda da minha feliz infância, lá na raiz da serra. Você vai usar o vestido e o véu da minha mãe, e não falo assim por estar sentimental, não é por causa da morfina. Você vai dispor dos rendados, dos cristais, da baixela, das jóias e do nome da minha família. Vai dar ordens aos criados, vai montar no cavalo da minha antiga mulher. E se na fazenda ainda não houver luz eléctrica, providenciarei um gerador para você ver televisão. Vai ter também ar condicionado em todos os aposentos da sede, porque na baixada hoje em dia faz muito calor. Não sei se foi sempre assim, se os meus antepassados suavam debaixo de tanta roupa. Minha mulher, sim, suava bastante, mas ela já era de uma nova geração e não tinha a austeridade da minha mãe. Minha mulher gostava de sol, voltava sempre afogueada das tardes no areal de Copacabana. Mas o nosso chalé em Copacabana já veio abaixo, e de qualquer forma eu não moraria com você na casa de outro casamento, moraremos na fazenda da raiz da serra. Vamos nos casar na capela que foi consagrada pelo cardeal arcebispo do Rio de Janeiro em mil oitocentos e lá vai fumaça. Na fazenda você tratará de mim e de mais ninguém, de maneira que ficarei completamente bom. E plantaremos árvores, e escreveremos livros, e se Deus quiser ainda criaremos filhos nas terras de meu avô. Mas se você não gostar da raiz da serra por causa das pererecas e dos insectos, ou da lonjura ou de outra coisa, poderíamos morar em Botafogo, no casarão construído por meu pai. Ali há quartos enormes, banheiros de mármores com bidés, vários salões com espelhos venezianos, estátuas, pé-direito monumental e telhas de ardósia importadas da França. Há palmeiras, abacateiros e amendoeiras no jardim, que virou estacionamento depois que a embaixada da Dinamarca mudou para Brasília. Os dinamarqueses me compraram o casarão a preço de banana, por causa das trapalhadas de meu genro. Mas se amanhã eu vender a fazenda, que tem duzentos alqueires de lavoura e pastos, cortados por um ribeirão de água potável, talvez possa reaver o casarão de Botafogo e restaurar os móveis de mogno, mandar afinar o piano Pleyel da minha mãe. Terei bricolages para me ocupar anos a fio, e caso você deseje prosseguir na profissão, irá para o trabalho a pé, visto que o bairro é farto de hospitais e consultórios. Aliás, bem em cima do nosso próprio terreno levantaram um centro médico de dezoito andares, e com isso acabo de me lembrar que o casarão não existe mais. E mesmo a fazenda na raiz da serra, acho que desapropriaram em 1974 para passar a rodovia. Estou pensando alto para que você me escute. E falo devagar, como quem escreve, para que você me transcreva sem precisar ser taquígrafa, você está aí? Acabou a novela, o jornal, o filme, não sei porque deixam a televisão ligada, fora do ar. Deve ser para que esse chuvisco me encubra a voz, e eu não moleste os outros pacientes com o meu palavrório. Mas aqui só há homens adultos todos meio surdos, se houvesse senhoras de idade no recinto eu seria mais discreto. Por exemplo, jamais falaria das putinhas que se acocoravam aos faniquitos, quando meu pai arremessava moedas de cinco francos na sua suite do Ritz. Meu pai ali muito compenetrado, e as cocotes nuínhas em postura de sapo, empenhadas em pinçar as moedas no tapete, sem se valer dos dedos. A campeã ele mandava descer comigo ao meu quarto, e de volta ao Brasil confirmava à minha mãe que eu vinha-me aperfeiçoando no idioma. Lá em casa como em todas as boas casas, na presença de empregados os assuntos de família se tratavam em francês, se bem que, para mamãe, até me pedir o saleiro era assunto de família. E além do mais ela falava por metáforas, porque naquele tempo qualquer enfermeirinha tinha rudimentos de francês. Mas hoje a moça não está para conversas, voltou amuada, vai-me aplicar a injecção. O sonífero não tem mais efeito imediato, e já sei que o caminho do sono é como um corredor cheio de pensamentos. Ouço ruídos de gente, de vísceras, um sujeito entubado emite sons rascantes, talvez queira me dizer alguma coisa. O médico plantonista vai entrar apressado, tomar meu pulso, talvez me diga alguma coisa. Um padre chegará para a visita aos enfermos, falará baixinho palavras em latim, mas não deve ser comigo. Sirene na rua, telefone, passos, há sempre uma expectativa que me impede de cair no sono. É a mão que me sustém pelos raros cabelos. Até eu topar na porta de um pensamento oco, que me tragará para as profundezas, onde costumo sonhar a preto e branco."
quarta-feira, 15 de julho de 2009
WINDSCREEN THEORY OR THE REVERSE OF KARMA
Esta é uma teoria que tenho vindo a desenvolver há já algum tempo e ultimamente com mais frequência. Tenho vindo a ser cobaia da realidade empírica desta teoria… Já me escangalho a rir sempre que me deparo uma e outra vez com a origem fáctica desta teoria… é mau de mais para não ser cómico! Tenho de a escrever para ver se me livro disto de uma vez por todas.
A windscreen Theory nasce de um acto banal: O acto de deitar água no pára-brisas (doravante “PB”) accionando ao mesmo tempo o respectivo limpa pára-brisas (doravante “LPB”). Até agora tudo faz sentido eu sei… Aliás o meu carro até acciona automaticamente os ditos LPB sempre que carrego no esguicho. Tudo isto é normal… Faz parte do quotidiano de quem conduz. Se está sujo lava-se muito simples (e higiénico).
Mas agora surge o problema:
PORQUE É QUE TODA A GENTE SE LEMBRA DE LAVAR A MERDA DO PB NO MOMENTO EM QUE CONDUZEM Á MINHA FRENTE!!!
A sério, já dei mil e uma voltas à cabeça e fiquei com um nó no cérebro e continuo sem perceber… PORQUÊ? Que mal fiz eu?!?
Sei que já devia estar habituada, normalmente tudo me acontece, do género de ir assistir jogos de rugby e estando na bancada ver a bola obviamente na minha direcção. Eu sei disso, as minhas amigas sabem disso, eu preparo-me para a defesa, elas nem se mexem porque sabem, como eu, que a bola vai cair em cima de mim. E cai, sempre. Eu rio-me… Eu sou um pára-raios de serviço e vivo bem com isso, mas todos os dias levar com três ou quatro lavagens de carros alheios tenham dó.
E depois comecei a pensar que tipo de pessoas faz isto? Vocês que me lêem fazem-no? Lavam os vossos PB sem se importar que o carro de trás fique com os respectivos todos sujos? O meu trabalho de teorização iniciou-se então com a identificação do tipo de pessoas que o faz. A saber:
- Dolo directo: aqueles que resolvem lavar o PB propositadamente com a intenção de sujarem os PB dos condutores que os perseguem; - Dolo necessário: aqueles que sabem que ao lavar o PB em andamento vão sujar os PB dos condutores que os perseguem, mas marimbam-se para esse facto e lavam na mesma. Eles que limpem os PB respectivos, que bem estão a precisar; - Dolo eventual: aqueles que sabem que ao lavar o PB em andamento correm o risco de sujar os PB dos condutores que os perseguem, mas têm acreditam que isso não vai acontecer. Pode ser que o vento venha de trás; - Negligência Consciente: aqueles que lavam o PB em andamento correm o risco de sujar os PB dos condutores que os perseguem mas que não se aperceberam que tinham um carro atrás deles quando accionaram o esguicho; e - Negligência Inconsciente: Aqueles que não fazem mínima ideia que ao lavarem o PB em andamento sujam o PB do carro que os persegue.
E aqui começa a windscreen theory.
Parte-se do pressuposto que as pessoas vagueiam na vida com um conjunto de princípios ético-morais. As pessoas podem ser caracterizadas pelo tipo de princípios que defendem. De modo a identificar/ qualificar uma pessoa e respectivos princípios consigo basta verificar a que grupo de “lavadores de PB em andamento” ela pertence. Senão vejamos…
O tipo de pessoa que lava o LP com dolo directo é um tipo completamente egocêntrico, revoltado, que procura vingança pelas vezes que o seu PB também foi sujo com água alheia. É uma pessoa inteligente pelo simples facto de já ter desistido de acreditar na justiça. No fundo, não é a pior pessoa do mundo mas é bastante irritante na mesma, porque ninguém tem a culpa do mal que lhe fizeram. Estas pessoas leram mal a teoria do Pay it forward aplicando-a às acções com impacte negativo na vida dos outros em vez de se limitarem a fazer o bem.
O tipo de pessoa que lava o LP com dolo necessário pertence a um dos tipos que mais me irrita. O facto de se estarem a marimbar revela um egoísmo atroz. Eu ainda aturo pessoas egocêntricas, agora egoístas, não há pachorra. Este tipo de pessoas passeia na vida a ter consciência das consequências dos seus actos mas desde que nada lhes aconteça está tudo bem. Idiotas. O tipo de pessoa que lava o LP com dolo eventual é um tipo bastante optimista. O que acaba muitas vezes por ser um desculpa óptima para se auto desculparem. No fundo, estes agem com dolo necessário mas convencem-se que vai tudo correr bem para não se sentirem tão mal. São pessoas mimadas e egoístas que querem acreditar que são muito boas pessoas e que têm sempre óptimas intenções. Desistam!!! Não enganam ninguém!
O tipo de pessoa que lava o LP com negligência consciente é um tipo constituído por pessoas porreiras porem um bocado distraídas. Até sabem que é chato levar com a água de um PB alheio mas esquecem-se muitas vezes de verificar se vem alguém atrás quando são eles a fazê-lo. Todos cometemos erros…
O tipo de pessoa que lava o LP com negligência inconsciente é definitivamente o tipo de pessoas que não suporto. Simplesmente odeio gente burra que anda a fazer merda pelo mundo porque pura e simplesmente não repararam ou nunca se aperceberam. Estas pessoas são as mais egoístas, egocêntricas e mimadas. Tudo o que vá para além dos próprios carros não lhes interessa. Atenção, que a maior parte dos acidentes é causada por este tipo de pessoas.
Depois de dissecar a windscreen theory comecei a extrapolar e cheguei à conclusão que esta tem como consequência a inversão do Karma. Sim… porque existem pessoas que, simplesmente, não lavam o PB em andamento (as chamadas madre-teresa-de-calcutá-deste-mundo). Pessoas que, mesmo depois de verem o seu PB todo enxovalhado por esguichos e até mesmo por aspersores de jardins de beira de estrada, continuam corajosamente a conduzir quase sem visibilidade, só para não sujarem o PB do carro que segue atrás. Serão estas pessoas compensadas algum dia? Quer-me parecer que não… Mas voltarei a esta teoria mais tarde…